Saúde da População Negra
Saúde da População Negra
 Isabel Cruz
De 18 a 20 de agosto, o Ministério da Saúde (MS) juntamente com a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) realizou o Seminário de Saúde da População Negra, reconhecendo finalmente que “as relações sociais no Brasil são marcadas pelo racismo – fato, há décadas, encoberto pela ideologia da democracia racial – denunciado constantemente pelos indicadores econômicos, educacionais ou de saúde.” Mas, para que o Ministério da Saúde tivesse este insight, ao longo de décadas muitas pessoas trabalharam firmemente no sentido de não só apresentar evidências científicas sobre o problema, mas também de exercer pressão política sobre os gestores. Não tenho condições de neste breve editorial relacionar todos e todas que contribuíram para a consolidação deste fato histórico que é a implantação do tema Saúde da População Negra na agenda do MS. Mas, gostaria de destacar duas destas cientistas ativistas que transformaram o seu conhecimento acumulado em ação para a mudança. A primeira é  Luiza Bairros, cientista social, que articulou o Sistema das Nações Unidas em torno da questão e criou condições para a proposição de uma política nacional de saúde da população negra, em 2000. Com base nesta proposta, intensificou-se a discussão tanto no movimento social quanto no âmbito da administração pública sobre a necessidade de reconhecimento do racismo em saúde e de implantação de estratégias para sua neutralização e promoção da saúde e bem-estar da população negra. A segunda pessoa que destaco é Maria Inês Barbosa, assistente social e sanitarista, cuja participação neste processo de luta pela equidade em saúde e atuação na SEPPIR permitiu a realização de um trabalho intensivo junto ao Ministério da Saúde para que este não ignorasse as demandas do movimento negro que tornaram-se deliberações das diversas conferências de saúde. 
No que se refere ao programa, o Seminário foi marcado principalmente pelo painel sobre Referências para o avanço da eqüidade na atenção à saúde da população negra que contou com as exposições sobre  promoção da igualdade racial como prioridade de governo, pela Dra. Maria Inês Barbosa (Secretária-Adjunta, Seppir), sobre uma breve retrospectiva (1995-2004) da atuação do MS na saúde da população negra , apresentada pelo Dr. Paulo Sergio de Carvalho (MS) e sobre a elaboração da Política Nacional de Saúde na perspectiva da promoção de igualdade racial, pelo Dr. Valcler Rangel Fernandes (Subsecretário de Planejamento e Orçamento, MS). Além deste, houve o painel referente às informações sobre a saúde da população negra e a necessidade de novas estratégias na política nacional de saúde no qual o tema evidências apontadas pelo Projeto “Situação de Saúde da População Negra Brasileira e Recomendações para Políticas, Ações e Programas” foi apresentado pelo Dr. Deo Costa Ramos (CTSPN, Funasa) e pela Dra. Fernanda Lopes (Coordenadora da Pesquisa, DFID). Outro tema deste painel foi sobre a situação atual e perspectivas da produção de informações e conhecimentos sobre a saúde da população negra, tratado pelo Dr. Nilo Bretas (Coordenador de Gestão e Informação, Datasus) e pela Dra. Elisabeth Carmen Duarte (Diretora do Departamento de Análise Situação da Saúde, SVS). De suma importância foi  a Solenidade de compromissos – falas de autoridades. Firmaram compromissos sobre saúde da população negra os representantes do Conasems, Dr. Luiz Odorico Monteiro de Andrade, do Conass, representado pelo Secretário estadula de Saúde-BA e do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Nesta solenidade, a  Ministra Matilde Ribeiro (SEPPIR) avaliou que neste momento histórico mais uma etapa acontecia quanto à Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial (PNPIR). Por sua vez, o Ministro Humberto Costa (MS) reafirmou o compromisso de encaminhar as deliberações da 12a Conferência Nacional de Saúde quanto à Saúde da População Negra e deu posse da Comissão Técnica de Saúde da População Negra. A emoção tomou conta de todos e todas quando se homenageou as Dras. Elza Berquó e Fátima Oliveira, o Dr. Amaro Alves, a Mãe Beata de Iemanjá (Odoiá!). O seminário foi marcado pelas trocas de experiências e apresentação das boas práticas nas Salas de Conversa sobre Anemia Falciforme, Implantação do quesito cor nas políticas públicas, Saúde e religiões de matriz africana, Saúde da mulher negra, Violência e sistema prisional, População Quilombola, e Saúde mental. Com a finalidade de traduzir em ações concretas para os governos municipais, estaduais e federal, incluindo a parceria com a sociedade civil organizada, as deliberações das conferências de saúde e do Plano Nacional de Saúde sobre saúde da população negra, o seminário realizou discussões em grupos de trabalhos que discutiram eixos temáticos, tais como a mortalidade precoce, a educação permanente, a promoção da saúde e a humanização do SUS (respeito á diversidade, assertividade, relação terapêutica), entre outros. Estas discussões foram sistematizadas em um relatório que servirá de apoio à ação do Comitê Técnico. Portanto, o Seminário Nacional de Saúde da População Negra e a criação do Comitê Técnico de Saúde da População Negra (Portaria, 1678, 13/08/2004, DOU, 157, seção 2, p19, 16/08/2004), no qual tenho a honra de ser membro titular, representam uma conquista do movimento negro e contribuem para a consolidação de um dos pilares do SUS que é o controle social. Conseqüentemente, esta vitória também é da sociedade brasileira como um todo. Todos ganham, quando todos ganham. Nunca é demais lembrar que só há paz e bem-estar com justiça social. Para tanto, o Brasil precisa reconhecer a existência e a atender demanda de 50% de seus cidadãos e cidadãs. Ainda que fossemos uma única pessoa, já teria esta obrigação. Quanto mais que nós somos milhões e milhões. Parabéns ao MS e à SPPIR pela parceria que firmaram com o movimento negro, comprometendo gestores e profissionais de saúde, no sentido de atender às demandas de saúde e bem-estar da população negra brasileira.
Passadas as celebrações, vamos ao trabalho. Afinal, nossa população está morrendo precocemente. Não podemos (nem devemos) esperar mais.
Publicado em Editorial do BNN, ISSN 1676-4893, v. 6, n. 66, 19/08 a 04/09/2004
Disponível em http://www.nepae.uff.br/siteantigo/bnn066604.htm
OBS atual: este evento foi organizado por José Marmo que depois fundaria a RENAFRO. Dele participou também Edna Roland, responsável pela implantação do quesito cor na SMS de São Paulo e relatora da Conferência de Durban
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