O Fórum Permanente Saúde das Populações Vulneráveis (FPSPV) é uma atividade da disciplina Diversidades, Equidade e Cuidados de Saúde, do curso de graduação em enfermagem, da qual faço parte da equipe de docentes. O FPSPV tem como missão é difundir a conscientização e aplicação do conceito “Discriminação Estrutural Zero”, especialmente no SUS. O FPSPV trabalha pela implementação das políticas de promoção da equidade social, assim como promove a interação dos vários interesses da pessoa/população socialmente vulnerável e estigmatizada com governança das políticas públicas, visando a garantia dos direitos humanos.

Neste semestre letivo, um dos Róruns realizados teve o tema “Misoginia: como o mais antigo dos preconceitos se manifesta no SUS e como desconstruí-lo?”. Uma homenagem ao movimento Marcha das Vadias (Gomes et al, 2014), considerando o modo como a questão da diversidade e inclusão de gênero, raça, sexualidade e gerações vem sendo tratada nos últimos anos.

Divulgação do FPSPV nas redes sociais

O Fórum aconteceu em 18/05, tendo como convidadas: Profa. Dra. Rita Costa, Movimento de Mulheres de São Gonçalo, e Alyne Dutra, psicóloga, coordenadora do Programa Municipal de Saúde Integral LGBTI+ de São Gonçalo.

Fórum com a dinâmica na forma de game “Pergunta às Peritas”. Foto Fernanda Brasil Schmidt.

O objetivo de aprendizagem com este tema é desenvolver atitudes e ferramentas para interromper o sexismo (misoginia, heterossexualismo, etc) internalizado – pessoal e organizacionalmente no Sistema Único de Saúde.

Para avançar neste aprendizado, o Fórum aconteceu utilizando como estratégia o jogo Pergunte à Perita ou ao Perito.

“Game” educacional

Como regra do jogo, de modo geral, cada pessoa convidada (expert) escolhe um número de 1 a 20 e recebe do(a) estudante a correspondente pergunta. O número selecionado é excluído da cartela. O tempo de resposta é de 3 minutos e respondida a pergunta, outras pessoas convidadas (experts) podem complementar ou contra-argumentar em, no máximo 2 minutos. Sucessivamente, as pessoas convidadas escolhem um número na cartela e recebem do(a) estudante a correspondente pergunta, até esgotar todas as 20 perguntas. Quem pergunta pode alterar ou adaptar a pergunta, se assim o desejar.

Como complemento ao “Pergunte à Perita”, foi proposto por mim que cada convidada complementasse sua resposta, indicando na “Roda de Intervenções”, com um adesivo colorido, a melhor ou prioritária intervenção pra o enfrentamento da misoginia no sistema de saúde.

RODA DE INTERVENÇÕES (ADAPTADA COM DIGITAIS)

O tempo de 2 horas/aula dedicado ao Fórum não foram suficientes para todas as 20 perguntas serem feitas. Julgo que superdimensionei o jogo. Neste tempo, foram formuladas e debatidas com os(as) estudantes estas 7 perguntas:

O que exatamente misoginia significa? Por que é o mais antigo dos preconceitos?

Em Diversidades, Equidade e Cuidados em Saúde, a pessoa está no centro do cuidado de saúde. Neste sentido, se uma pessoa acredita que está recebendo cuidados inadequados devido ao preconceito contra mulher, quais medidas o(a) profissional de saúde, em especial a(o) enfermeira pode orientar a pessoa a tomar com base nas políticas de equidade de gênero?

Como a misoginia e demais vieses de gênero impactam, por exemplo, a taxa de mortalidade e a taxa de morbidades (ISTs, estresse pós-traumático, etc), tornando-se um problema de saúde pública?

Pesquisas sobre estereótipos de gênero revelam que profissionais de saúde (mesmo mulheres) tendem a acreditar que as mulheres exageram sua dor. Com base nestas evidências, como qualificar a relação enfermeira(o)-paciente por meio das políticas de saúde da mulher e da pop LGBT+ no ponto do cuidado?

Mostre ou apresente  iniciativas do SUS, para o enfrentamento da misoginia, tais como: triagem universal contra a violência íntima ou doméstica, busca de caso, intervenção em crise (suporte de 1ª. linha), exames forenses (Sala Lilás), entre outras.

Pesquisas mostram que protocolos clínicos com foco na equidade e baseados em evidências científicas para o tratamento podem reduzir o risco de viés implícito que afeta os cuidados de saúde. Há ao menos um protocolo clínico que ajude o(a) profissional de saúde, em especial a(o) enfermeira(o), durante a realização da entrevista clínica, a identificar a misoginia como causa de violência?

Caso durante a entrevista clínica se identifique a misoginia como causa, o que aconteceria depois? Notificação compulsória da violência por nossa parte, enquanto futuros(as) profissionais de saúde?

Caso durante a entrevista clínica se identifique a misoginia como causa, o que aconteceria depois? Que equipamentos há na rede SUS/SUAS de apoio à vítima de violência de gênero?

As peritas responderam às perguntas e também debateram com a turma sobre outras barreiras ou interseccionalidades que se colocam contra a mulher. Complementaram seus argumentos, indicando na Roda de Intervenções as ações (pessoa, família/comunidade, sistema) que a(o) enfermeira pode realizar para o cuidado de saúde da mulher vítima de misiogina e outras violências de gênero.

Os pontos são as respostas das peritas quanto a ações de saúde pública recomendadas para o enfrentamento da misoginia. Foto Fernanda Brasil Schmidt.

Participaram do Fórum a jornalista Fernanda Brasil Schmidt, da Câmara Municipal de Niterói, e Fabíola de Souza Silva, assessora parlamentar do gabinete da vereadora Benny Briolly.

No que se refere ao processo ensino-aprendizagem-avaliação, está registrado na figura a seguir, a autoavaliação dos(as) estudantes sobre a atividade e sua participação nela.

Autoavaliação da atividade com base na Taxonomia Solo

Mensagem chave deste Fórum: o enfrentamento da misoginia contra a usuária dos serviços de saúde (paciente), dentro dos serviços de saúde, demanda da(o) enfermeira(o) tanto autoconhecimento sobre os vieses opressivos quanto o desenvolvimento de habilidades em relação a intervenções, tais como: defensoria, formação de coalizão, entre outras, na visão das peritas. Sem perder de vista, no meu entender, a necessidade de ter habilidades quanto à triagem (sobre violência doméstica, por ex) ou ensino em saúde (teach back, por ex) ou consulta ou, mais ainda: teleconsulta, entre outras intervenções.

Referências e bibliografia de interesse:

Gomes C, Sorj B. Corpo, geração e identidade: a Marcha das vadias no Brasil. Soc estado [Internet]. 2014May;29(2):433–47. Available from: https://doi.org/10.1590/S0102-69922014000200007

CRUZ, Isabel CF da. Anotações sobre como os profissionais de saúde podem desconstruir o racismo institucional dirigido à população negra no SUS. Boletim NEPAE-NESEN, [S.l.], v. 13, n. 2, oct. 2016. ISSN 1676-4893. Disponível em: <http://www.jsncare.uff.br/index.php/bnn/article/view/2867/709>. Acesso em: 21 may 2023.

CRUZ, Isabel CF da. Diversidade, Equidade em Saúde e Cuidados de Enfermagem – proposta de disciplina para a graduação em enfermagem na EEAAC/UFF.. Boletim NEPAE-NESEN, [S.l.], v. 11, n. 3, july 2015. ISSN 1676-4893. Disponível em: <http://www.jsncare.uff.br/index.php/bnn/article/view/2780/667>. Acesso em: 21 may 2023.

CRUZ, Isabel CF da. 16ª Conferência Nacional de Saúde e os Impactos do Racismo na Saúde da População Negra: Formação para desconstrução dos determinantes sociais em saúde. Boletim NEPAE-NESEN, [S.l.], v. 15, n. 1, oct. 2018. ISSN 1676-4893. Disponível em: <http://www.jsncare.uff.br/index.php/bnn/article/view/3097/780>. Acesso em: 21 may 2023.

Cruz, Isabel Curso Gratuito e Autoinstrucional de Preparo para o Parto e Aleitamento. NEPAE/UFF. Niterói, 08/07/2020. Disponível em https://nepae.uff.br/?p=1181

Como citar:

Cruz, Isabel. Misoginia: como o mais antigo dos preconceitos se manifesta no SUS e como desconstruí-lo?. NEPAE/UFF. Niterói, 21/05/2023. Disponível em https://nepae.uff.br/?p=2727

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